7 de julho de 2010

Nem com muito orgulho, nem com muito amor.*

Os brasileiros que não torcem pela seleção pentacampeã do mundo.
 
 *Reportagem produzida para a disciplina Técnicas de Comunicação I.

De quatro em quatro anos, um evento mexe com a rotina de todos no Brasil: bancos fecham mais cedo, aulas são canceladas, eventos adiados... Tudo parece parar por conta da Copa do Mundo. Galvão Bueno, seus similares e campanhas publicitárias sentenciam frases como “o povo brasileiro está unido para torcer pela seleção”. O “país do futebol” encontra seu momento máximo: ruas são pintadas, torcedores se fantasiam, tudo vira um grande carnaval em dia dos jogos da seleção.
Atitude aparentemente justificável, afinal a seleção brasileira é a mais vitoriosa e temida do mundo. Não importa em que competição esteja, todos os analistas a apontam como favorita. Pentacampeão mundial, o time canarinho é admirado por torcedores de todo o globo. Seus craques do passado figuram em todas as listas de melhores jogadores de todos os tempos e seus craques do presente jogam nas maiores equipes da Europa. Pelé, coroado o “rei” do esporte, é brasileiro. Então, nada mais natural que todos os torcedores brasileiros tenham orgulho de sua seleção, certo?
Errado. Embora tudo pareça conspirar a favor, existem torcedores apaixonados por futebol que, nascidos na “pátria de chuteiras”, não gostem de sua seleção. Eles estão em todo país, e alguns se agrupam em comunidades virtuais como a “Não ao Futebol Moderno”, do Orkut, em que 66% dos seus 3.635 membros declararam torcer contra ou serem indiferentes à seleção brasileira. Ainda que, logicamente, sejam poucos se comparados ao restante dos brasileiros, eles apresentam argumentos consistentes para serem “do contra”.
É o que faz Diego Sbitkowski, morador de Joinville, que aprendeu com o pai - fã de Maradona - a não gostar da seleção. Ele argumenta que não se identifica com os jogadores que vestem a camisa verde e amarela, e reclama: “o futebol de seleções, para mim, passa obrigatoriamente por existir uma identificação dos jogadores com o povo do país. É algo que eu vejo, por exemplo, quando Croácia ou Escócia entram em campo. Aqui eu sinto um simples time montado aos gostos da CBF”.
Por sinal, o órgão máximo do futebol nacional é alvo fácil desses torcedores, que criticam a maioria de seus métodos. Na lista de reclamações, por exemplo, estão a má organização dos campeonatos nacionais e a marcação de amistosos internacionais da seleção contra países fracos tecnicamente por altos preços. Os torcedores criticam a confederação por não prestar contas dos seus gastos, dando margem à suspeitas de corrupção e mau uso do dinheiro arrecadado. O paulista João Paulo Kishi é contundente: “A CBF é uma instituição que está acabando com o nosso esporte. Reduto de safados, corruptos e usurpadores, que cobram milhões de dólares para que países paupérrimos tenham a ‘honra’ de serem goleados pela nossa seleção”, referindo-se a jogos como os que o Brasil realizou na fase de preparação para o Mundial 2010, contra Tanzânia e Zimbábue - país que passa por maus bocados econômicos e é governado pelo ditador Robert Mugabe. Diego concorda, e completa os comentários de João Paulo: “Vejo na CBF tudo aquilo que o povo vê no nosso Congresso, e vejo nos seus cartolas aquilo que vemos em nossos políticos mais canalhas”.
Além da CBF, o comportamento do torcedor brasileiro comum em época de Copa também incomoda esses dissidentes. O patriotismo, inexistente no cotidiano do brasileiro, costuma aflorar-se e receber críticas: “Isso só aparece de quatro em quatro anos em um povo que é apaixonado por futebol, mas sequer se preocupa co m a situação que o país vive. Isso é ser patriota?”, pergunta o estudante carioca Herbert Borges. O paulista Luiz Gustavo vai mais longe e ironiza: “Algumas pessoas mal sabem o ano em que ocorrem as eleições, mas de uma hora pra outra viram brasileiros ‘com muito orgulho e com muito amor’”.
Como se tudo isso não fosse suficiente, esses torcedores - fanáticos por futebol durante os 365 dias do ano - incomodam-se com a maneira com que a Copa contagia os que normalmente não gostam de futebol. Pensam que sua paixão é “indevidamente apropriada” por pessoas que não merecem gostar de futebol, já que normalmente não entendem muito do assunto. O estudante Michel Silva, do Rio de Janeiro, sintetiza: “Se tem algo que amantes do futebol não gostam é de ouvir gente que nunca acompanha o futebol achando que conhece mais do que você. E isso acontece frequentemente em época de Copa”.
Portanto, quando você estiver vendo um jogo do Brasil e ouvir alguém comemorando a união nacional em torno da bola, lembre-se desses torcedores. Sim, existem brasileiros que comemoraram o gol de Henry na última Copa do Mundo e que não sambaram na comemoração do penta, em 2002.


                                                      Brasil-sil-sil!

2 comentários:

  1. Boa tarde.

    Cheguei aqui após ler um comentário seu no texto: "O MARACANÃ QUE MORA EM MIM", do Simas. Somos ambos vascaínos. Também sou blogueiro e teria imenso prazer em te receber por lá. O endereço é www.paponacolina.blogspot.com
    À propósito do tema desse seu texto, escrevi algo parecido por ocasião da copa do mundo. Sou um dos que "cagam e andam" pro selecionado nacional. Pode encontrar o post aqui:

    http://paponacolina.blogspot.com/2010/05/selecao-da-globo.html

    A gente vai se falando. Abraços.

    João Medeiros

    ResponderExcluir
  2. Mateus, vc é autor, tem luz própria. Se exercitar sua autoria vai construir um lugar solido no mundo da comunicação. Levo fé!
    =)

    ResponderExcluir